sábado, 11 de junho de 2011

Darwinismo na Literatura I


O conto “A Máquina do Tempo” (1), do autor britânico H. G. Wells (1866-1946), tem início com um debate filosófico entre uma personagem cujo nome não é revelado, sendo apenas conhecido como o viajante do tempo, e os seus convidados. Discursam sobre as três dimensões que os rodeiam – comprimento, largura e espessura – e sobre uma quarta, o tempo. Esta conversa serve de mote para a pergunta lançada pelo anfitrião: crêem os convidados na possibilidade de viajar no tempo? Perante a questão levantada, a audiência responde com um acentuado cepticismo.

Na semana seguinte a casa do viajante do tempo recebe novamente convidados para um jantar mas, uma vez que o proprietário tarda a aparecer, os presentes iniciam a refeição. Entretanto, chega o anfitrião, ferido, a coxear, cansado e esfomeado. Curiosos, os convidados, que já estavam à mesa, quiseram saber o que se tinha passado, mas primeiro o viajante alimenta-se e, só depois, dirige-se para a poltrona e descreve o que acontecera: finalmente, tinha terminado a construção da sua máquina do tempo e viajara milhares de anos para o futuro. Aí, conhecera uma nova espécie humana, muito mais bonita e alegre, mas que revelava poucos traços de inteligência e um acentuado medo do escuro. Esta era a raça dos Elóis que habitava uma paisagem idílica, num colossal jardim sem ervas daninhas, com plantas de uma incrível beleza, e com frutos suculentos dos quais se alimentava, era uma natureza que havia sido aperfeiçoada pelo homem, no passado, com recurso à tecnologia.

No entanto, esta espécie humana não vive sozinha, e cedo o viajante encontra uma raça antagónica constituída por criaturas horrendas, que receiam a luz e vivem nas trevas do subsolo – era a raça dos Morlocks.

Ao longo do conto, a personagem principal vai reflectindo sobre como estas duas espécies se teriam originado, concluindo, com base na teoria evolucionista proposta pelo naturalista britânico Charles Darwin (1809-1882), que ambas teriam tido um ancestral comum (o homem moderno), e que devido às condições sociais que se viviam no século XIX (estas condições corresponderiam à pressão selectiva) a classe trabalhadora ficou isolada da classe alta – os trabalhadores passaram a viver nas fábricas do subsolo, enquanto os ricos habitavam a superfície da Terra, onde existiam jardins melhorados através da tecnologia - levando a um acentuado acumular de diferenças, acabando por originar, com o tempo, duas espécies diferentes: “Gradualmente, a verdade fez-se luz: o Homem não permanecera uma espécie única, mas diferenciara-se em dois ramos distintos (…)”(2). Mas se dúvidas houvesse quanto à influência darwinista na obra de Wells, dissipar-se-iam ao ler a secção em que o autor comenta que “(…) pessoas pouco familiarizadas com especulações como as do jovem Darwin (…)” esquecer-se-iam de explicações da física do sistema solar, ou seja, o autor afirma que desconhecer as ideias de Darwin é também desconhecer outras ideias científicas (no caso, a Física) que estavam em voga na época, atribuindo ao Darwinismo uma enorme importância para a compreensão dos fenómenos naturais que nos rodeiam.

(1) Outras obras do mesmo autor são "O Homem Invisível" e "A Guerra dos Mundos".
(2) H. G. Wells, “A Máquina do Tempo”, pp. 102-103

Bibliografia:
H. G. Wells, A Máquina do Tempo, editorial estúdios cor, tradução Rosa Canelas

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