terça-feira, 10 de agosto de 2010

Às portas do paraíso

“Heidegger e um hipopótamo chegam às portas do paraíso” (2009), é um livro escrito por Thomas Cathcart and Daniel Klein que explica, através de um diálogo repleto de humor, as reflexões filosóficas de vários pensadores ocidentais sobre a vida, a morte, e a vida depois da morte.
Este é um livro interessante para quem se questiona sobre os temas analisados ou para quem quer conhecer um pouco mais de filosofia. Esta disciplina é aqui tratada de um modo informal e acessível a qualquer leitor. É possível encontrar neste livro o registo de vários filósofos tais como Platão, Descartes, Espinosa, Heidegger, Nietzsche, Camus, Sartre e até mesmo B. Russel.
O capítulo que mais me interessou talvez tenha sido o que faz referência ao conceito de Céu, ou Paraíso. Os autores tentaram compreender a origem deste conceito, e de como evoluiu até às várias concepções que fazemos do mesmo. Por exemplo, analisando o Antigo Testamento constataram que os Hebreus não tinham qualquer noção do que hoje chamamos “Céu” nem da vida depois da morte. Segundo aos autores, quando o profeta Daniel fala de “vida eterna”, refere-se-lhe em termos de ressurreição (1).
Já no Novo Testamento, quando Jesus se refere ao “Reino dos Céus”, ele quer dizer Reino de Deus. Mas como os primeiros cristãos tinham origem judaica, não usavam o nome de Deus por ser considerado demasiado sagrado (2). Assim, o Reino dos Céus, em vez de ser considerado um lugar, deve ser tido em conta como um tempo, um tempo futuro, em que a vontade de Deus se tornaria aceite por todas as pessoas. Como esclarecem os autores, aquando da oração “venha a nós o vosso reino”, entender-se-á venha a nós esse tempo de Deus connosco (3).
Toda esta análise continua até encontrarmos outra ideia que facilmente reconhecemos no nosso imaginário colectivo: S. Pedro com as chaves do Paraíso. Segundo os escritores deste livro, esta ideia surge da junção de duas passagens bíblicas: Jesus diz que dará a Pedro as “chaves do reino dos céus”(4), no Evangelho de S. Mateus; e, de acordo com as visões de João no Livro do Apocalipse, na Nova Jerusalém encontram-se doze portas, sendo cada uma delas paradisíaca – daqui chegamos à imagem de S. Pedro às portas do paraíso.
Também o conceito da estética do Céu varia. Há quem o imagine como um local suspenso nas nuvens, ou então como um magnífico prado relvado. Ambas as imagens chegam ao nosso imaginário colectivo através de representações artísticas da Idade Média e do Renascimento (5). Esta visualização depende ainda da seita ou religião seguida por determinada pessoa.
É claro que o livro aborda outras questões e as várias abordagens por parte dos filósofos ao longo do tempo. A título de exemplo, podemos encontrar as questões sobre o que é viver a vida, a problemática do absurdo da vida, o tema do suicídio, reflexão sobre as vantagens e desvantagens da imortalidade, a relação entre as novas tecnologias e as ciências da saúde, e outros temas.

Fonte:
Cathcart, T. & Klein, D., “Heidegger e um hipopótamo chegam às portas do paraíso”, Publicações D. Quixote, Alfragide, 2010 – tradução de Isabel Veríssimo

Para saber mais:

Notas:
(1) – Como explicado pelos autores, é um regresso à vida, e não a continuação da vida noutro lugar.
(2) – Lembrar de um dos mandamentos do Antigo Testamento, o de não invocar o nome de deus em vão.
(3) – O texto referente a esta discussão pode ser encontrado em: T. Cathcart & D. Klein (2010), pp. 132-143.
(4) – O que se deveria entender é que Pedro iria ter um papel importante no anúncio do novo tempo, ou nova era.
(5) T. Cathcart & D. Klein (2010), pp. 148-164.

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