sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Boas Festas!

O Armarium Libri deseja Feliz Natal e Próspero Ano Novo a todos os seus colaboradores, seguidores e leitores!



domingo, 19 de dezembro de 2010

História da Vida Privada em Portugal

Saiu recentemente o primeiro volume da História da Vida Privada em Portugal, dirigida pelo Prof. José Mattoso, editada pelo Círculo de Leitores e pela Temas e Debates e que pretende ser para Portugal o que foi para parte da Europa a obra célebre dirigida por Philippe Ariès e Georges Duby. Está dividida em 4 volumes, cada qual dirigido por um especialista. O primeiro, referente à Idade Média, é dirigido pelo Prof. Bernardo Vasconcelos e Sousa; o segundo, sobre a Idade Moderna, é de Nuno Gonçalo Monteiro; o terceiro (A Época Contemporânea) é de Irene Vaquinhas e o último (Os Nossos Dias), que nos apanha a nós - contemporâneos - em flagrante, foi dirigido por Ana Nunes de Almeida e contou não com uma equipa de historiadores, mas de sociólogos. Os temas abordados estão no domínio do privado, muitas vezes cruzado com a vida quotidiana: a casa, a família, a infância, a sexualidade, o sentimento religioso, etc. São situações de grande importância para nós portugueses estas incursões em temas novos da História, revelando que a historiografia está avançando todos os dias, com discussão, crítica, releitura das fontes e até de estudos já clássicos da área.

sábado, 18 de dezembro de 2010

Venerável Bede (67?-735)

Quando se fala da História mais antiga, clássica e alto-medieval por exemplo, os artefactos arqueológicos têm uma grande preponderância, já que as fontes escritas existem em modesto número. No entanto, quando existem são muito valiosas, desde logo porque são coevas de um tempo muito recuado, que se reconstitui com dificuldade. Estamos a pensar precisamente no Venerável Bede, cronista britânico dos séculos VII e VIII da nossa era. Terá nascido na primeira metade da década de ’70 daquele século[1], algures a norte do rio Humber, na região chamada Northumbria. Pelos 7 anos de idade entrou no mosteiro de Monkwearmouth e ou aí mesmo ou no mosteiro de Jarrow passou o resto da sua vida.[2] Possivelmente professou no primeiro e passou mais tarde ao segundo, pois temos notícia de que morreu lá.[3] Foi beneditino e terá passado a sua vida monacal a ler e a escrever, para o que aproveitou a vasta biblioteca do mosteiro de Jarrow, que contava algumas centenas de volumes. O próprio Bede deixou obras em inglês antigo e em latim, mas aquelas perderam-se.[4] Entre comentários à Bíblia (Homiliarium) e uma cronologia desde o nascimento de Cristo (De Tempore Ratione, 725), para dar dois exemplos, escreveu uma obra histórica fundamental para seguir a conjuntura da Ilha nos tempos mais antigos – Historia Ecclesiastica Gentis Anglorum, acabada em 731.[5] Trata-se da narração crítica, com recurso a provas documentais, do que aí ocorreu desde o tempo dos Romanos até ao século VIII, embora haja poucos dados anteriores ao século V. As suas qualidades de historiador, fazem com que continue a ser de leitura fundamental. Os missionários da sua região acabaram por divulgar os seus escritos, especialmente entre os Francos.[6] O Papa Leão XIII (1810-1903; papa desde 1878) declarou-o Doutor da Igreja por decreto de 13 de Novembro de 1899).
Notas:
[1] A New Caxton Encyclopedia, vol.2, London, The Caxton Publishing Company, 1973, p.617, s.v. “Bede, the Venerable”, diz 672; já a Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, vol.4, Lisboa – Rio de Janeiro, Editorial Enciclopédia Limitada, s.d., p.414, s.v. “Beda (O Venerável)” e a Lexicoteca – Moderna Enciclopédia Universal, dir. e coord. de Leonel Moreira de Oliveira, vol.III, Círculo de Leitores, 1986, p.150, s.v. “Beda “O Venerável”, apontam para 672 ou 673.
[2] The New Caxton Encyclopedia, vol.2, p.617, s.v. “Bede, the Venerable”.
[3] Lexicoteca – Moderna Enciclopédia Universal, vol.III, p.150, s.v. “Beda “O Venerável”.
[4] Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, vol.4, p.414, s.v. “Beda (O Venerável)”.
[5] The New Caxton Encyclopedia, vol.2, p.617, s.v. “Bede, the Venerable”
[6] The New Caxton Encyclopedia, vol.2, p.617, s.v. “Bede, the Venerable”.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Livro sobre Neurociências

"A Alma está no Cérebro" é um livro sobre neurociências, da autoria de Eduardo Punset, ao estilo dos livros de divulgação do neurocientista português António Damásio.
É o primeiro capítulo que dá o título ao livro, e em que se faz uma contextualização histórica do estudo da mente e da evolução do conceito de alma - o que hoje denominamos de alma tem um significado diferente do que teria na Idade Média, por exemplo; e o estudo da alma, mais concretamente o estudo das emoções, do cérebro e da questão do Eu, encontra-se no ramo das neurociências, levando o autor a concluir com base nisto, e justificando no final do capítulo, que a alma poderá não ser mais que o resultado das reacções físico-químicas (incluindo acção de hormonas, portanto, também biológicas) que ocorrem no cérebro. Aliás, todo este livro trata de uma análise a este importantíssimo órgão do nosso corpo.
Para além da contextualização histórica, há outros capítulos extremamente interessantes abordados neste trabalho, nomeadamente o tema da lavagem ao cérebro (capítulo 6) e manipulação de pessoas, assim como a análise à mente do psicopata e índoles violentas (capítulos 9 e 10), ou outras temáticas como a educação emocional (capítulo 8), inteligência criativa (capítulo 11), a relação cérebro e linguagem (capítulo 14) e os efeitos nefastos da depressão para o cérebro (para além da vida pessoal, obviamente) (capítulo 15).
Como livro de divulgação que é, pode ser compreendido por qualquer leigo no assunto, mas arrisco dizer, que é de particular interesse para biólogos, psicólogos, médicos ou investigadores (principalmente em neurociências).

Fonte:
Eduardo Punset, "A Alma está no Cérebro - Uma radiografia da máquina de pensar", Publicações Dom Quixote, Alfragide, 2008 - tradução de João Pedro George

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Exposição "Profissões com História" no Centro Cultural D. Dinis, em Porches

Segue um texto da minha autoria, editado na Gazeta de Lagoa, sobre a exposição "Profissões com História":

"Está patente no Centro Cultural D. Dinis, em Porches, a exposição “Profissões com História”, que teve início a 8 de Novembro e continuará aberta ao público até Fevereiro de 2011. Esta iniciativa de cariz privado, mas com o apoio da Junta de Freguesia que cedeu o espaço, tem como objectivo dar a conhecer o património histórico-cultural da região, assim como sensibilizar para a criação de um Museu Etnográfico no Concelho de Lagoa, como salienta Virgílio Monteiro, organizador do projecto.
Tudo começou com um desafio do presidente da Junta para montar a réplica do interior de uma Escola Primária Centenária no Festival do Caracol, em Porches”, recorda Virgílio. A adesão das pessoas foi imediata ao verem a carteira, o quadro negro de ardósia e os antigos manuais escolares, lembrando os tempos de estudante. O sucesso repetiu-se, pouco depois, na FATACIL, e na FNAC do Centro Comercial da Guia, onde esteve exposta durante trinta e três dias, na abertura do ano escolar.
Agora em exibição encontra-se um espólio mais completo relativo a várias actividades profissionais, dividido em diversas secções – há o lugar dos professores, do sapateiro, do barbeiro, dos vinhos, do barro e da alfaiataria. “Foi essencialmente o entusiasmo das pessoas nas iniciativas anteriores que me motivou a continuar”, explica o organizador.
Também o presidente da Junta de Freguesia está satisfeito com o trabalho demonstrado e felicita a iniciativa. Quanto a um possível Museu localizado em Porches, essa é uma luta da Junta há cerca de vinte anos e que deve continuar a ser incentivada. No entanto, o presidente alerta para a necessidade de se encontrar um local apropriado e haver disponibilidade financeira. Só depois se poderá avançar.
Na primeira semana, o Centro Cultural já recebeu várias dezenas de visitantes, e a expectativa é que venham ainda muitos mais. A exposição está aberta todos os dias das 10h até 12h30, e à tarde com marcação prévia. A entrada é gratuita.

Nota: O Organizador agradece profundamente o apoio do Presidente e dos membros da Junta de Freguesia de Porches, assim como dos populares que têm manifestado o apoio constante a esta iniciativa, contribuindo com sugestões e ainda com objectos que complementam a exposição. A todos um grande bem-haja."

Fonte: Gazeta de Lagoa, Director e Editor: Arthur Ligne, Sexta-feira, 19-11-2010, 22º ano, Nº 1045

terça-feira, 16 de novembro de 2010

O Empreendedor-Minuto

“O Empreendedor-Minuto” é um livro que aborda a temática do empreendedorismo e as várias etapas que se sucedem na criação de uma empresa, com recurso a uma parábola - a história de Jud McCarley, um rapaz que almeja criar o seu próprio negócio e o que tem de fazer para o conseguir. Apesar de esta ser uma obra de ficção, os autores basearam-se na sua experiência e em factos reais para atingir vários objectivos, tais como, analisar os factores necessários para a criação de uma empresa, definir o que é relevante para o empreendimento vingar, alertar para o que pode correr mal, e explicar como lidar com as situações menos boas que aparecem em qualquer projecto.
Este livro de divulgação pode ser lido por qualquer pessoa mas, arrisco-me a dizer, é mais adequado para aqueles que têm uma veia empreendedora e não sabem por onde começar. Num período de desemprego acentuado em Portugal e em que se valoriza o empreendedorismo, este é um livro a ter em conta. Como costumo referir, estes livros de divulgação podem, e devem, servir como ponto de partida para uma literatura mais técnica, no futuro.

Sobre os autores:
- Ken Blanchard é director de uma empresa de formação e consultadoria em gestão, a Ken Blanchard Companies, Inc. É conferencista e autor de diversos livros best-sellers a nível internacional.
- Don Hutson é director-geral da empresa de formação U.S. Learning, foi fundador e presidente da National Speakers Association, e é autor de diversos livros de gestão.
- Ethan Willis é director-geral da Prosper Learning, Inc. e foi galardoado com o prémio Entrepreneur of the Year Ernst&Young

Fonte Bibliográfica:
Blanchard, K.; Hutson, D.; Willis, E., “O Empreendedor-Minuto”, Gestãoplus Edições (chancela da Bertrand Editora), Lisboa, 2009 – Trad. Catarina Espadinha

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

O Gestor-Minuto

“O Gestor-Minuto” é o título de um livro que tem como propósito indicar uma metodologia eficiente de gestão de empresas e equipas. Para isso, os autores recorrem à fábula de um jovem que tem como ambição tornar-se um gestor eficiente. Após viajar por vários países e ter conhecido diferentes abordagens de gestão, a personagem regressa à sua terra sem ter conseguido encontrar o que procurara. Contudo, pouco depois, ouve rumores da existência de um gestor formidável que, ironicamente, trabalharia numa cidade perto da sua. Como qualquer pessoa que sabe o que quer, foi logo conhecer esse guru da gestão, com o intuito de receber conhecimentos úteis. Devido à desilusão que havia experimentado em situações anteriores, partiu com baixas expectativas. No entanto, ao longo do livro, e à medida que vai contactando com os colaboradores do gestor, compreende que é ali que vai encontrar muitas das respostas às suas questões.
A mensagem que os autores pretendem passar é a de três regras fundamentais: os objectivos-minuto, os elogios-minuto e as repreensões-minuto; que mais não são do que dizer o essencial de um modo breve e na altura certa. De seguida explica-se porque funcionam estas regras tão bem.
Pessoalmente, considero este um “livro-minuto” porque tem as ideias-chave bem condensadas e a leitura é extremamente fluida.

Sobre os autores:
Ken Blanchard é director de uma empresa de formação e consultadoria em gestão, a Ken Blanchard Companies, Inc. É conferencista e autor de diversos livros best-sellers a nível internacional.
Spencer Johnson é formado em psicologia pela University of South California e em medicina pelo Royal College of Surgeons, e autor de diversos best-sellers.
Fonte Bibliográfica:
Blanchard, K. & Johnson, S., “O Gestor-Minuto”, 5ª reimpressão, Gestãoplus Edições (chancela da Bertrand Editora), Lisboa, 2010 – Trad. Rita Figueiredo

sábado, 6 de novembro de 2010

Divulgar Cultura

Informo que se encontra em funcionamento o blog Divulgar Cultura que pretende agregar e disponibilizar a um maior número de pessoas, vários eventos culturais, tais como lançamento de livros ou discos, colóquios, congressos, entre outros. As áreas em destaque são as mais variadas, incluindo Ciência, História, Literatura, Música, Artes Plásticas, só para citar algumas.
É mais uma iniciativa dos membros da equipa Armarium Libri.

sábado, 30 de outubro de 2010

Sobre a Economia Portuguesa

Muito se tem discutido nas últimas semanas sobre a economia portuguesa e as finanças públicas, a propósito do Orçamento de Estado para o ano de 2011. Uns defendem que o orçamento deve ser aprovado, outros que deve ser chumbado; alguns clamam pela intervenção do Fundo Monetário Internacional (FMI), outros nem querem ouvir falar dessa hipótese; a culpa do estado das contas públicas é das décadas de governação do Partido Socialista (PS), segundo alguns, mas o Partido Social Democrata (PSD) também tem responsabilidade, acusam outros. Muito a opinião pública se tem manifestado, mas falará com conhecimento de causa?

Para uma discussão séria, as pessoas devem estar minimamente informadas e, por essa razão, divulgo livro Economia Portuguesa – As últimas décadas, da autoria do historiador Luciano Amaral, numa edição conjunta da Fundação Francisco Manuel dos Santos e da Relógio d’Água Editores.

O livro encontra-se dividido em duas partes. A primeira parte realiza uma contextualização histórica, analisando a evolução da economia portuguesa desde os anos '50 até aos dias de hoje, ou seja, relembra o panorama dos anos de ditadura, contextualiza o período de revolução, e analisa os anos seguintes, referindo as duas vezes em que o FMI esteve em Portugal (1978-1979) e (1983-1985); é, portanto, esta informação histórica que nos permitirá compreender como chegámos ao estado actual. Na segunda parte são analisados dois temas em particular: o Estado-Providência e o Crescimento Económico. O Estado-Providência, uma das mais importantes realizações a nível político, social e económico da democracia em Portugal, só foi conseguido após a denominada Revolução dos Cravos. Se bem que tenha elevados custos financeiros, também trouxe melhores condições para a vida dos cidadãos de Portugal, resultando de mais investimento da parte do Estado, particularmente na Saúde e na Educação: hoje em dia, estas duas áreas em conjunto assimilam cerca de 14% do PIB nacional. Relembre-se ainda a importância da criação do Serviço Nacional de Saúde em 1979 e as melhorias que trouxe para a Saúde Pública, como a diminuição da mortalidade infantil e o aumento da esperança média de vida, por exemplo. Quanto ao crescimento económico, é estudado o modo como o mercado de trabalho e a educação podem influenciar a economia e reflecte-se sobre a importância de cada um destes factores.

Após a leitura deste breve livro, qualquer cidadão terá mais bases sustentáveis de argumentação, falando com conhecimento de causa. Será também um bom princípio para se aventurar noutras leituras complementares, uma vez que esta obra, embora completa, é dirigida a um público alargado, sendo um bom livro de divulgação, sem grandes preciosismos académicos. Pode ser encontrado em livrarias e nalguns estabelecimentos comerciais, como o Pingo Doce.

Sobre o autor:
Luciano Amaral (Porto, 1965) é licenciado em História pela Universidade Nova de Lisboa e doutorado em História da Civilização pelo Instituto Universitário Europeu de Florença, especializado em História Económica. É docente na Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa e colunista em jornais.

Bibliografia:
Luciano Amaral, Economia Portuguesa – As últimas décadas, Lisboa, Fundação Francisco Manuel dos Santos & Relógio d’Água Editores, 2010

sábado, 16 de outubro de 2010

Júlio Carrapato - Sobre a importância da Reflexão

E sempre que falte aos investigadores a probidade do crítico e a seriedade do pensador, todas as démarches feitas no sentido da verdade resultarão infrutíferas”(1).

Esta afirmação do advogado, publicista e ensaísta algarvio Júlio Carrapato (1919-1985), leva-nos a meditar sobre a importância da constante reflexão por parte de um investigador. Lembra-nos que um trabalho de pesquisa, qualquer que seja a temática de estudo, não passa apenas pela recolha de informação, mas de igual modo pela assimilação dos conteúdos, análise e sentido crítico.
Este foi um dos primeiros ensaios escritos pelo autor, ainda com dezoito anos.

(1) – Júlio Carrapato, “O Mistério Camoniano e a «Alma PoéticaLusitana»” (1937), in “Obras (Quase) Completas” (1996).

Bibliografia:
Júlio Filipe de Almeida Carrapato, “Obras (Quase) Completas”, 1º Volume, Algarve em Foco Editora, Faro, 1996

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

"A Maravilhosa Aventura da Vida" - Novidades

Informam-se os leitores, que o livro de divulgação científica "A Maravilhosa Aventura da Vida", da autoria da Doutora Clara Pinto Correia, faz parte do Plano Nacional de Leitura. Este livro já fora tratado no nosso blog em Junho do ano passado.
Mais informações, aqui.

Flaubert e a análise do quotidiano

Sobre o autor:
Gustave Flaubert (1821-1880), foi um escritor francês, descendente de uma longa geração de médicos. O seu pai, que era cirurgião, abominava o interesse do seu filho pela literatura, querendo que ele seguisse medicina. Aos dezoito anos enfrentou o seu pai, informando-o que não seguiria a carreira médica. Então o seu progenitor enviou-o para uma escola de direito, curso que Flaubert abandonou, para dedicar-se definitivamente à escrita, atitude que levou o seu pai a considerá-lo um caso perdido. Excelente observador, desde uma tenra idade que tomava apontamentos sobre o comportamento das pessoas, factor essencial para a temática das suas obras. A este propósito, escrevem Henry e Dana Thomas: “Filho de um dissecador de corpos humanos, veio a tornar-se um dissecador de almas humanas”(1). Analisou, retratou e criticou a sociedade do seu tempo, sendo reconhecido pela profundidade das suas análises psicológicas. Como exemplo clássico destas observações, por ser a obra mais polémica naquele período, refere-se o livro “Madame Bovary”, em que Flaubert critica os costumes burgueses. Este é um autor do Realismo, amigo de vultos da literatura francesa como Honoré de Balzac, Victor Hugo, Émile Zola e Guy de Maupassant, entre outros.

A Obra:
A Quasi Edições, que durante quase uma década editou nomes sonantes da literatura, dos clássicos aos contemporâneos, deixou, entre nós, um conjunto de obras de grande valor.
O escritor francês Gustave Flaubert, no conto “Um coração simples”, relata a estória de Felicité, uma mulher bondosa, ingénua, demasiadamente dedicada aos outros, e a quem, ao longo da vida, acontecem sucessivas perdas. Órfã de ambos os pais, cresce a servir em casa de estranhos, tendo uma infância infeliz; apaixona-se, mas é abandonada pelo noivo; vai servir para outra cidade na casa da Sra. Aubian, de quem se torna fiel empregada e amiga dos filhos da patroa, Virginie e Paul; entretanto, o rapaz é enviado para um colégio interno, e a rapariga para um convento de freiras, ficando novamente sozinha; é autorizada a receber a visita de um sobrinho, mas este morre após uma estadia em Cuba; também Virginie acaba por morrer; para compensar a solidão, a patroa permite-lhe que tome conta de um lindo papagaio que lhe faz companhia, mas também este, tempos depois, morre; com o passar dos anos, também a sua patroa acaba por falecer. À medida que se desenrola o enredo, o leitor questionar-se-á se esta mulher, já velha, surda e que tem por única companhia um papagaio empalhado, alguma vez chegará a ser feliz. É um livro que se foca essencialmente na bondade e na perda.

Ainda o mesmo livro inclui um outro conto, “A lenda de S. Julião Hospitaleiro”. Para celebrar o nascimento de Julião, os seus pais deram uma luxuriante festa no castelo em que habitavam, após a qual, cada um dos seus progenitores, individualmente, recebeu uma profecia acerca do seu filho. Um eremita apareceu à sua mãe e profetizou que o seu filho viria a ser um santo, ao seu pai apareceu um cigano que balbuciou palavras imperceptíveis, mas que ele entendeu como glória e felicidade para o petiz. A criança cresce sadia e corajosa, tornando-se um admirável caçador, que mata todos os animais com um prazer bárbaro, até ao momento em que é amaldiçoado por um veado, que o condena a matar os seus progenitores. De regresso a casa, sucedesse-se uma série de eventos, em que, por acidente, Julião quase mata os seus pais em diversas ocasiões. Temendo que a maldição do veado se concretizasse, abandonou o castelo e partiu para outras terras onde conquistou glória e um império. Esta estória é uma reflexão sobre o destino, levando à velha questão grega se existe destino e, caso exista, poderá ser contrariado, ou independentemente das acções de um indivíduo o que está destinado acontecerá?

(1) – Henry Thomas e Dana Lee Thomas, “Vidas de Grandes Romancistas”, p.290.

Bibliografia:
- Gustave Flaubert, “Um coração simples – seguido da Lenda de S. Julião Hospitaleiro”, Quasi edições, Vila Nova de Famalicão, 2008 – tradução de Maria Emanuel Côrte-Real e Júlio Machado.
– Henry Thomas e Dana Lee Thomas, “Vidas de Grandes Romancistas”, Edição Livros do Brasil, Lisboa – tradução de James Amado.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Faleceu a Professora Paula Escarameia (1960-2010)


Faleceu a Professora Paula Escarameia no passado dia 3 de Outubro, vítima de doença prolongada. Licenciada no ano de 1983 em Direito pela Universidade Católica Portuguesa, com a média de 17 valores – a mais elevada do curso – a jurista que se veio a especializar em Direito Internacional Público, fez o mestrado e doutorou-se em Harvard. Foi docente em várias universidades e, notavelmente, foi “a primeira mulher e portuguesa”, como assinala o site da TSF, a entrar para a Comissão de Direito Internacional da ONU, sendo reeleita em 2007. Numa nota da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, a Professora Teresa Pizarro Beleza descreveu deste modo a falecida catedrática: “Às características profissionais de rigor e seriedade, e à sua inteligência invulgar, juntava uma personalidade afável e generosa e uma grande integridade pessoal e académica.” A Professora Paula Escarameia era também membro do Tribunal Permanente de Arbitragem, sediado em Haia. Terá sepultura no cemitério do Alto de S. João, para onde será levada hoje de manhã desde a Igreja de S. João de Deus. Entre as obras que deixou, enumeramos as seguintes:

The Limitations of International Law: the case of East Timor, Harvard Law School, 1986;

Colectânea de Jurisprudência de Direito Internacional, Coimbra, Almedina, 1992;

Formation of Concepts in International Law: subsumption under self-determination in the case of East Timor, Lisboa, Fundação Oriente: Centro de Estudos Orientais, 1993 [trata-se da tese de doutoramento, já publicada na Universidade de Harvard (Cambridge, Massachusets, Harvard University Press, 1988)];

Colectânea de Leis de Direito Internacional, Lisboa, Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, 1994 [com reedições em 1998 e em 2003];

Reflexões sobre Temas de Direito Internacional Público: Timor, a ONU e o Tribunal Penal Internacional, Lisboa, Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, 2001;
O Direito Internacional Público nos Princípios do Século XXI, Coimbra, Almedina, 2003 [com reedição em 2009];

Para servir as aulas, reuniu ainda os elementos da obra Direito Internacional Público: colectânea de jurisprudência e doutrina para as aulas práticas, Lisboa, 1989-1990.

Fontes:


Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa: http://www.fd.unl.pt/Anexos/Diversos/PAULA_ESCARAMEIA_2010.pdf; a imagem veio do mesmo site (http://www.fd.unl.pt/default.asp#);

Biblioteca Nacional: porbase.bnportugal.pt

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Raul Lino e a Casa do Cipreste



Raul Lino: um arquitecto de formação alemã

Raul Lino nasce em 1879 em Lisboa. O seu pai toma a decisão de inscrevê-lo num colégio em Inglaterra na região de Windsor, aos 10 anos. Inglaterra nestes anos vivia o Domestic Revival assim como o Arts and Crafts, o que, juntamente com o contacto com a arquitectura inglesa, poderá ter influenciado a formação do arquitecto.
Três anos depois, a Alemanha (Imperial) é a escolha seguinte do pai para a formação do seu filho. Deste modo, Lino aprenderia a língua enquanto estudaria na Handwerker und Kunstgewerbeschule, em Hanover. Teve aulas teóricas da Technische Hochschule e aprendeu os ofícios e principios técnicos mais desenvolvidos para se tornar arquitecto. Conheceu Albrecht Haupt, profundo conhecedor da arquitectura portuguesa de quinhentos, que lhe ensinou a olhar para a arquitectura de Portugal. William Morris e John Ruskin eram já nomes populares na Alemanha.
A sua convivência com Haupt durante os dois anos de trabalho no seu atelier deu a Lino uma sólida formação germânica, enriquecida pela leitura de Thoreau e Goethe. Thoreau tem extrema importância na formulação do pensamento de Lino na medida em que este aprende a valorizar o habitat natural do homem que a sociedade industrial ia esquecendo. Também no contexto alemão Lino vai aprender os valores de uma teoria arquitectónica da espacialidade (lançadas por Schmarsow e por Hildbrand no ano de 1893 – chegada de Lino a Alemanha).
Regressa a Portugal em 1897 e encontra um país rural, atrasado em relação à Europa que conheceu. Já prevenido pelo seu mestre, Raul Lino chega ao seu país com um olhar atento e compreensivel, numa tentativa de o reconhecer. Nasce “
a tentativa de recuperar os valores de um habitar, valorizando-os num contexto de um Portugal possível[1].
Inicia a sua vida profissional com encomendas colocadas pelos seus amigos-clientes para a zona de Cascais e Estoril, onde é evidente a marca deixada pelas viagens a Marrocos e ao Alentejo, onde viu a arquitectura portuguesa meridional.
Azulejos, cerâmicas, vitrais, mobiliário e até bordados são áreas que Lino foi desenvolvendo ao longo da sua vida, mostrando assim uma enorme maleabilidade e vontade de integrar a arte na vida humana.



A transição do século e a proposta de Raul Lino

O oitocentismo artístico foi marcado por um forte sentimento pátrio que se reflectiu sobretudo na arquitectura. Caracterizado pelos mais diversos revivalismos, o século XIX vai conhecer nos seus últimos anos uma “
ruptura da civilização[2] (p.507) apoiada por novos instrumentos da Revolução Industrial (telefone, electricidade, motor de explosão, aeroplano, etc). Assim, surge uma nova mentalidade cujas linhas de força apontavam para conceitos como o funcionalismo e a técnica, ambos em confronto com as convenções académicas e a ideia de arte. A engenharia pujante propunha novas técnicas e materiais que valorizavam a operacionalidade. O século XX (primeiras duas décadas) viu-se, por isso, culturalmente dividido entre progressistas apologistas desta nova modernidade e românticos ou culturalistas que a rejeitavam, onde se inseria Lino. A arquitectura vai assim caracterizar-se por um ecletismo resultante de uma sociedade portuguesa financeiramente fraca para banalizar a nova proposta e de uma Academia insegura, que perde forças na transmissão da mensagem da arte como valor espiritual graças ao maquinismo industrial que se vinha impondo na sociedade.
É neste contexto que surge Raul Lino, mais precisamente numa linha de reacção contra a de Ventura Terra, em Lisboa, e Marques da Silva, no Porto. Estes arquitectos distinguem-se de Lino não só pela formação parisiense que tiveram mas também pela proposta pragmática e racional que apresentaram. Com Ventura Terra, a cidade de Lisboa recebe uma série de projectos para equipamentos na área social, da saúde e educação, dotados de um programa técnico e utilitário. Quanto a Marques da Silva, a sua importância para o Porto consiste também num programa para equipar a cidade, nalguns casos assumindo um claro funcionalismo. O concurso realizado para o projecto do pavilhão de Portugal para a Exposição Universal de Paris de 1900 testemunhou o confronto entre os dois arquitectos Lino e Terra. A proposta de Lino apresenta pela primeira vez uma abordagem que se prende a valores nacionais, vencida pela proposta de Ventura Terra.
Raul Lino foge à prática das beax-arts vigente em Portugal e cria uma linha de pensamento “
encarada no contexto da pastoral visão idílica do campo, onde se refugiou o sector mais culto da sociedade portuguesa[3] a geração de 90, composta por nomes como Teixeira de Carvalho, Ribeiro Artur, Pessanha, Fialho, historiadores e críticos de arte que elogiavam e apoiavam o jovem arquitecto. Sobre este sentimento nacionalista já se tinha pronunciado a geração de 70 (Ramalho Ortigão, Eça de Queiroz, Oliveira Martins e Guerra Junqueiro).
Sustentadas por uma sólida base quinhentista que o seu mestre lhe passara, as ideias de Lino recuavam à matriz arquitectónica do século XVI para encontrar “
numa coerência histórica, nacional e «genuína»[4] a definição de uma «casa portuguesa», que traduzisse o modo de ser e de estar português. Apesar das constantes interpretações que esta ideia teve, como por exemplo a definição de casa portuguesa num contexto nacional ou num contexto de província, Raul Lino procurava materializar, sobretudo em moradias individuais, numa arquitectura moderna, um carácter estético português que atentava àquilo que Portugal tem de característico. Esta ideia é dada por Ana Tostões quanto à côr, luz, clima, materiais típicos de cada região que ajudam a dar esse sentido nacional, enquanto que J. Augusto França encontra cinco pontos na prosposta de Raul Lino: a utilização do alpendre, a cobertura sanqueada e arrematada pelo beiral, a cal branca que revestia toda a cobertura parietal, os vãos evidenciados pela cantaria e o emprego dos azulejos.

A Casa do Cipreste

Em 1912 Raul Lino decide construir a sua própria residência familiar em Sintra, na Calçada de São Pedro.
O terreno irregular e a pique foi fundamental para um projecto sentimentalmente estudado pelo arquitecto, cujas ideias de Thoreau se faziam sentir na escolha de uma construção inserida na Natureza. Esta “
obra de arquitectura doméstica[5] é contida no seu exterior, não perceptivel ao cidadão comum que passeia pela Calçada de São Pedro.
A casa segue a irregularidade do terreno, como uma construção orgânica que se desenvolve conforme os limites naturais. É organizada em torno de um pátio exterior ajardinado que tem um papel nuclear na relação interior-exterior. Esta está patente em elementos interiores exteriorizados (o átrio) e elementos exteriores interiorizados (a varanda), que acentua a procura de um jogo dinâmico entre o homem e a natureza que lhe dá continuidade.











Planta da Casa do Cipreste






A entrada faz-se pela zona oeste, através de escadas que fazem a ligação de cotas entre a rua e o átrio (função de acolher o homem, valoriza-se o acto de entrar em casa-abrigo). Este espaço distribui num primeiro nível para espaços de carácter mais social: sala de jantar, sala de estar e desta para a varanda. A primeira é de planta oval, virada a nordeste, com um pequeno nicho do lado direito onde existe uma lareira. A esta sala têm acesso os serviçais, sendo contíguos os espaços de serviço, a cozinha e a dispensa. De referir ainda a organização dos espaços serviçais em torno de um pequeno pátio exterior a oeste, proporcionando assim iluminação natural a todos eles. Estes espaços têm ainda uma instalação sanitária própria e uma entrada independente.



Sala de jantar


Sala de estar


Sala de estar: pormenor da varanda

Cozinha


A planta da sala de estar desenvolve-se num octógono alongado no qual se abre uma varanda rectangular a sudeste. Esta penetra no pátio exterior, numa relação de intimidade com a natureza.
O átrio faz também ligação às zonas de carácter mais privado através de um corredor de distribuição. Deste tem-se acesso aos quartos, virados a sudeste e com vista sobre o pátio exterior, sendo que o quarto principal está servido por um quarto de vestir que liga à zona de higiene. Esta é composta por três zonas distintas: lavabo, instalações sanitárias e quarto de banho, este último com vista para o pátio.
Uma arcada em L no exterior enquadra o pátio protagonista, sendo rematada pelo atelier do arquitecto, que tem ainda uma entrada pelo exterior. O volume do atelier sofre uma rotação que contrasta com a ortogonalidade da arcada, realçando a clausura do pátio.
















De referir também a relação entre a envolvente natural rude e rochosa com o pátio exterior ajardinado que acentua a relação homem-natureza. Sendo o seu desenho de carácter orgânico, toda a casa é pensada para o homem contemplar a natureza: do pátio exterior, da envolvente natural, e até das vistas que Sintra oferece (serra pontuada por símbolos como o Palácio da Pena ou o Castelo dos Mouros). Alexandre Rey Colaço, um dos seus amigos, defendia que a casa devia fechar-se à rua e abrir-se para o jardim, ideia que Lino veio a utilizar para enaltecer a relação com a natureza. As suas obras têm sempre um carácter islamizante, no qual o Palácio de Sintra tem um papel fundamental, tendo sido este um palácio (de fadas) que conhecera desde sempre. A Casa do Cipreste serve os principais traços de personalidade do artista, a meditação e a independência.



Para ele, como para os seus amigos-clientes, arquitectura não é fachada mas sim um espaço para viver com coisas, com coisas que dimensionam o espaço[6], tais como os objectos que compõem o mundo das artes decorativas que na Casa do Cipreste vão ser evidentemente valorizadas. A sala de jantar é decorada por um enorme painel decorativo de pintura a fresco, com motivos vegetalistas, cujo plano coube ao próprio Raul Lino (foi pintado por um professor da Escola Industrial de Setúbal). Quanto aos azulejos, são sobretudo de padrão (com motivos diversos como espirais e linhas onduladas), coloridos e recortados com o seu próprio desenho na parede, que apesar das reminiscências do passado (possivelmente mudejares) apresentam uma linha moderna (existe uma relação plástica entre a parede e o motivo desenhado, muitas vezes ganhando espessura).
O ambiente é controlado pelas peças decorativas, numa tentativa de dar um sentido de espacialidade e um ritual de vivência.


*


Raul Lino, arquitecto considerado por José Augusto França como arquitecto da geração de 90, inspira-se no século XVI para a procura de uma «Casa Portuguesa» que fizesse juz à maneira de ser e de estar portuguesa, ao qual não é alheia a arquitectura mudejar alentejana. Contra o racionalismo, “
contra o estilo «à antiga portuguesa»” [7] e a favor de um espirito nacional, Lino condensa na sua residência em Sintra todas as experiências e ideias que marcaram o seu pensamento (principalmente até à decada de 1920). Projecto de desenho orgânico que põe em evidência a relação do homem (como indivíduo e não Homem como humanidade) com a natureza, tem sempre em conta a noção de espacialidade e de valores como beleza, nobreza e subtileza, valores que pretendem alcançar a proporção (valor tão caro à arquitectura). As artes decorativas enaltecem o sentido da arte como parte integrante na vida humana, sendo que o azulejo e a pintura a fresco ganham novos contornos no revestimento parietal da Casa do Cipreste.
Cipreste é a árvor
e da solidão, da liberdade, do bem. Raul Lino estava só num mundo artístico que olhava para outras propostas que não a do próprio, que partia à descoberta de uma “Casa Portuguesa”. Contudo, nunca deixou de ser um homem livre, que medita em paz com a natureza. É curioso reparar que a porta de entrada para a residência tem um vitral no qual se pode ler o referido verso: “Se tiveres de sobejo, sê liberal como a tamareira. Se nada tiveres para dar, então sê um azad, ou um homem livre, como o cipreste”. Aqui é possivel entender como Lino se identificava com esta árvore. A acompanhar a representação do cipreste e dos versos, estão dois símbolos que remetem para as ondas luminosas do bem e para o caminho para a perfeição.

[1] Cit. in Almeida, Pedro Vieira; Fernandes, José Manuel – História da Arte Portuguesa. Edições Alfa:1986. Volume 14 (pág. 82)

[2] Cit. in Pereira, Paulo (dir.) – História da Arte Portuguesa. Lisboa: Temas & Debates, 1995, volume 3 (pág. 507)

[3] Cit. in Dalila Rodrigues (coord.), Tostões, Ana – Arte Portguesa: da pré-história ao século XX. Volume 16 (pág.15)
[4] Cit. in França, José-Augusto – História da Arte em Portugal no século XIX. Volume 2. Lisboa: Bertrand 1966 (pág. 160)

[5] Cit. in França, José Augusto – Raul Lino: exposição retrospectiva da sua obra. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1970 (pág. 90)
[6] Cit. in Carvalho, Manuel Rio – Raul Lino: exposição retrospectiva da sua obra. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1970 (pág. 198)
[7] Cit. in França, José Augusto – Raul Lino: exposição retrospectiva da sua obra. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1970 (pág. 106)

Viva a República!

Hoje, dia 5 de Outubro de 2010, celebra-se o centenário da República Portuguesa.
Viva a República!
Imagem retirada do site da Embaixada de Portugal no Brasil

domingo, 3 de outubro de 2010

Ciclo de Conferências - 100 anos da República

Realizar-se-á, em Outubro, um ciclo de conferências sobre a primeira tentativa de implementação da República em Portugal com o golpe de 31 de Janeiro de 1891.
Esta iniciativa é organizada pelo Instituto de História Contemporânea (IHC) e pela União das Associações de Comércio e Serviços (UACS), e coordenada por Paulo Jorge Fernandes e Daniel Alves, tendo lugar na Sala do Conselho, sede da UACS, Rua Castilho, 14, Lisboa.

Programa:
- Maria Antonieta Cruz, Univ. do Porto, “O Golpe de 31 de Janeito de 1981: uma ousadia breve?” Data: 11 Outubro de 2010, 18h.
- Isabel Corrêa da Silva, ICS, Univ. de Lisboa, “O espelho fraterno: o Brasil no imaginário do 31 de Janeiro” Data: 18 Outubro 2010, 18h.
- Daniel Alves, IHC, FCSH, Univ. Nova de Lisboa, “O «31 de Janeiro» dos lojistas: republicanismo e participação eleitoral do pequeno comércio lisboeta”. Data 25 de Outubro de 2010, 18h.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Congresso Psicologia Positiva

Divulga-se, junto de todos os interessados, que irá decorrer, nos dias 29 e 30 de Setembro, o 1º Congresso Português Internacional de Psicologia Positiva, a decorrer no Salão Nobre da Reitoria da Universidade de Lisboa.


Nota: Este congresso realiza-se com o apoio da Comissão de Comemorações dos 100 anos da República Portuguesa.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Noite dos Investigadores 2010

A Noite dos Investigadores é um evento promovido pela Comissão Europeia com o objectivo de aproximar os Investigadores dos cidadãos. Centenas de cidades, de 32 países europeus irão desenvolver, em simultâneo, acções de divulgação científica, nesta sexta-feira, dia 24 de Setembro. Portugal conta com quatro cidades para este evento: Lisboa, Coimbra, Olhão e Porto.

Como noticia o site da Associação Viver a Ciência, o que se pretende com as várias iniciativas que se irão desenrolar, é “estimular a reflexão, a discussão e o debate público sobre o quotidiano dos investigadores, o poder e as limitações do trabalho que desenvolvem, os sucessos e as frustrações, as decisões que têm de assumir e o impacto da ciência na sociedade.”

Consultar o programa no site: Cientistas ao Palco

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

A Sociedade Medieval Portuguesa

Foi reeditada este mês pela Esfera dos Livros A Sociedade Medieval Portuguesa - aspectos de vida quotidiana, do falecido Professor A. H. de Oliveira Marques. Publicado pela primeira vez em 1964, este livro, que aborda vários temas da vida dos nossos antepassados da Idade Média, teve várias reedições, mas encontrava-se actualmente esgotado. O Prof. Oliveira Marques, competente pioneiro nos assuntos de História Medieval e da I República, analisa aqui a alimentação, o vestuário, as relações de trabalho, os passatempos, a saúde e outros temas, servindo-se quer de fontes primárias (sem descurar o que a literatura e a gravura podem revelar), quer de outros excelentes autores que, antes dele, trabalharam sobre os mesmos assuntos, como Henrique da Gama Barros (História da Administração Pública em Portugal nos Séculos XII a XV, 1885-1922) e António de Sousa Silva Costa Lobo (História da Sociedade em Portugal no Século XV, 1903), por exemplo. A reedição desta obra é tanto mais importante quanto é um facto que faltam outras acessíveis e manipuláveis sobre aspectos da vida quotidiana portuguesa. Entre o que há, podem citar-se um pouco ao acaso e sem esgotar os títulos, as de Nuno Luís Madureira (Lisboa. Luxo e Distinção. 1750-1830, 1990, p. ex.), de José Leite de Vasconcellos, do ponto de vista etnográfico (Etnografia Portuguesa, p. ex.) e os capítulos que sobre isso falam nas Nova História de Portugal e Nova História da Expansão Portuguesa (esta para o nosso antigo Ultramar). Já sem considerar o que nos diz a mera observação da vida, estas incursões científicas vêm provar que não há anedotas da História, nem histórias da História. Qualquer facto pode ser inserido num capítulo da História. Por muito pitoresco que pareça, pode e deve ter um tratamento científico, pois traz uma marca do passado. O que faz falta ir dizendo é que é necessária a submissão de todos os acontecimentos ao estudo científico: a sua crítica e a sua inclusão no sistema organizativo dos temas em História.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Escola: Sucesso para os nossos filhos

Se queremos que os nossos jovens tenham sucesso na vida, então cabe-nos incentivá-los a estudar.
Ser Pai é difícil e educar um filho não é fácil. Não existe um livro, ou um manual com uma fórmula definitiva sobre como educar um jovem. Mas uma coisa parece-me certa, se queremos o melhor para os nossos filhos devemos encaminhá-los para a educação e proporcionar-lhes, na medida do possível, uma formação cultural.
O Problema
Há uns sete anos, ia eu a meio da licenciatura, quando comecei a ouvir uma frase, que, infelizmente, é hoje um chavão, e dizia o seguinte: “Para que andam estes jovens a tirar cursos, se não têm nada a ganhar com isso? Hoje, o “canudo” já não é sinónimo de emprego”. Está claro que esta afirmação é falsa e muito prejudicial para o futuro do nosso país, em geral, e da futura geração, em particular.
A Análise
Os jovens têm muito a ganhar se completarem o ensino secundário e se ingressarem numa universidade, pois uma boa educação é sinónima de esperança num futuro melhor.
É verdade que somos bombardeados por estatísticas que referem um grande número de licenciados no desemprego, mas é preciso ver que se tratam de milhares num universo de milhões de licenciados, e que esse desemprego se restringe a determinados cursos (1). Portanto, onde quero chegar é que no geral aprender compensa.
Quanto à questão de uma licenciatura não garantir emprego por si mesma, essa situação não é de agora. É necessário realizar algum esforço, e de preferência logo enquanto alunos.
Possíveis Soluções
Ao longo do ano lectivo é possível a realização de workshops, cursos de formação, voluntariado, ou actividades num núcleo estudantil. São opções que enriquecem o currículo e servem de ferramentas de trabalho. Nesta vida tudo é incerto, e cada acção nossa aumenta a probabilidade de sucesso.
É muito importante ler. Leiam o que vos der mais prazer: literatura portuguesa ou estrangeira, livros clássicos ou contemporâneos, livros de divulgação científica ou de história das ciências, manuais teóricos ou práticos, o que quiserem, mas leiam. Leiam os avós, os pais e os filhos. Em alternativa à compra de livros, existe a possibilidade de consulta em bibliotecas públicas; em terras mais isoladas existem até as bibliotecas itinerantes.
Vão aos museus e a exposições: abram os vossos horizontes. Ao Domingo grande parte dos museus são gratuitos, informem-se.
A Notícia
Na capa do jornal i vem o seguinte título: “Sucesso = Escola; Ensine esta lição aos seus filhos. Quem estuda recebe melhores salários”. No interior do jornal encontramos dados que comprovam o que tenho vindo a dizer. Na Europa, em média, os patrões pagam duas vezes mais a quem tem qualificação superior do que a quem tem apenas o secundário. Esta diferença é maior nos países com poucos universitários, em que estes recebem quase quatro vezes mais que um não-licenciado, como é o caso português. Um licenciado irá sempre auferir um ordenado maior que um colega sem licenciatura, na mesma função e com mais experiência (2).
Passemos agora da realidade, para uma situação hipotética. Imagine-se um casal sem licenciatura, em que cada um ganhe cerca de 450€ mensais. Os dois juntos, no final do mês terão 900€ disponíveis para as despesas. Agora imaginemos um casal de licenciados em que cada um recebe cerca de 800€ mensais. No final do mês terão cerca 1600€ disponíveis. Fica para reflexão.
Conclusão
A educação e o incentivo para os estudos são uma mais-valia para qualquer cidadão. Como pais, como familiares, como amigos, deveríamos incentivar os jovens a procurarem uma vida melhor. Incutir-lhes valores como o brio profissional e a ambição, para que queiram ser ainda melhores. Somos livres, podemos escolher: nada fazer, ou agir.

Notas:
(1) – Cerca de 10% de pessoas com licenciatura entre os 25 e os 29 anos estão desempregadas.
(2) – Jornal i, Quarta-feira, 8 Setembro 2010, Ano 2, nº 418, pp. 14-17

Fanatismo Religioso

O pastor norte-americano, Terry Jones, de uma pequena igreja evangélica, Dove World Outreach Centre de Gainesville, Florida, decidiu assinalar o 9º aniversário do atentado às Torres Gémeas queimando cópias do Corão, livro sagrado dos muçulmanos. Afirma que pretende “enviar uma mensagem clara aos radicais de que não seremos controlados nem dominados pelos medos nem pelas ameaças”, segundo noticia o jornal i (1). – Agora pergunto eu, quem é que está a ser radical?

Os líderes de várias religiões já se manifestaram. O Vaticano, preocupado, já condenou esta iniciativa afirmando que todas as religiões merecem ser respeitadas (2). O líder religioso da comunidade islâmica em Portugal considera esta atitude um desrespeito pela religião, mas acredita que "no mundo os muçulmanos irão reagir pacificamente e com prudência, fazendo orações a deus para que não haja distúrbios nem complicações nas relações entre países islâmicos e o ocidente", citado pelo jornal Diário de Notícias (3).

O governo norte-americano também já se manifestou, argumentando que se a vontade do pastor persistir, o exército americano no mundo árabe pode correr perigo.

Deixo aqui algo para pensarmos: Uma pessoa é cristã porque foi educada numa cultura cristã. Se essa mesma pessoa tivesse nascido e crescido numa cultura árabe, provavelmente seria muçulmana. Não existe nenhuma religião que seja a correcta. Ainda para mais, tendo em conta que as três religiões ocidentais (Judaísmo, Cristianismo e Islão) têm a mesma origem na cultura Semita (como já referido neste blog). Este fanatismo religioso (seja muçulmano ou cristão) resulta da ignorância das pessoas. Por isso a educação é de extrema importância. Para quando um mundo tolerante? Para quando um respeito sério pela Declaração Universal dos Direitos Humanos?

Termino com uma frase do poeta alemão Heinrich Heine (1797-1856): “Aqueles que queimam livros, acabam por queimar homens”.

(1) - Jornal i, Quarta-feira, 8 Setembro 2010, Ano 2, nº 418, p. 12
(2) - Correio da Manhã, Quinta-feira, 9 Setembro 2010 – versão on-line consultada http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/ultima-hora/vaticano-contra-queima-do-corao  
(3) – Diário de Notícias, versão on-line http://dn.sapo.pt/Inicio/interior.aspx?content_id=1658900 consultado no dia 9-9-2010.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Canções com História

A Música também tem História.

Já temos falado neste blog da história enquanto disciplina própria, mas também de outras suas vertentes, como a história regional ou a história das ciências. No entanto, pouco ou nada abordámos da história da música. Vou então dar um primeiro passo e desbravar caminho. Acompanhem-me.

Não sendo um especialista no tema, não vou discorrer sobre a história desta arte, mas antes divulgar alguns trabalhos recentes na área. Começo por referir a “Antologia da Música Europeia – dos trovadores a Beethoven” (década de 1970), da Sassetti, representando apenas a música ocidental europeia, e tendo início na Idade Média e Renascimento (Volume I) até ao século XIX (último volume). Esta antologia, para além dos livros, possui também uma colecção de discos em vinil.

Nas duas décadas que se seguiram, com maior ênfase na década de 1990, habituámo-nos a ver na televisão os programas do Vitorino de Almeida (n. 1940), compositor, maestro e escritor português. Esta programação de índole cultural pretendia dar a conhecer à população boa música, principalmente a designada música erudita (tem este nome em contraste com a música popular). No seguimento desta vontade de contribuir para a educação musical dos portugueses, informa, numa entrevista ao jornal “Público” (2009), que pretende leccionar um curso de História da Música para a população em geral (1).

Actualmente, na Antena3, rádio estatal, é possível ouvir a rubrica “Canções com história”, em que os apresentadores explicam o contexto em que certas músicas foram criadas, ou o evoluir da musicalidade de um determinado grupo, os percursos de algumas bandas, etc. Como é habitual em quem investiga história, de quando em quando depara-se com alguns acontecimentos que, de tão caricatos, tornam-se hilariantes. Hoje (dia 8 de Setembro), a rubrica falou de uma música da banda “Marcy Playground”. Segundo o relato do apresentador do programa, um dos músicos da banda encontrava-se a namorar com a sua companheira no quarto do campus universitário, quando foram apanhados pela colega de quarto da namorada, que ao entrar terá proferido: “smells like sex and candy”, qualquer coisa como “cheira a sexo e rebuçado”. Esta expressão ficou gravada na mente do músico e foi sendo trabalhada ao longo dos anos, até que, em 1998, editou a música intitulada “Sex and candy”, que voltou a ser tocada nas rádios (2).

Fontes:

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Sugestões de leitura

Selecção de interessantes textos que podem ser encontrados no blog De Rerum Natura:

- Análise sobre o estado da educação em Portugal, como resultado de uma conversa de há 25 anos com o ilustre Rómulo de Carvalho: A Educação está sempre mal? - texto de António Piedade

- Referência ao sucesso que têm sido as vendas dos livros Ensaios da Fundação, onde se encontra o livro O Ensino do Português, da autoria de Maria do Carmo Vieira (aqui). - Os autores do ArmariumLibri planeiam falar deste livro em breve.


Aproveito para sugerir também uma rápida leitura no nosso outro blog Raphus cucullatus.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Carlos Almaça (1934-2010) - Remissão

Faleceu no passado dia 3 de Agosto o biólogo e historiador da ciência Carlos Almaça. Sobre este antigo docente da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e ex-director do Museu Bocage, escrevemos uma breve biografia em Raphus Cucullatus - www.raphus-cucullatus.blogspot.com.

Às portas do paraíso

“Heidegger e um hipopótamo chegam às portas do paraíso” (2009), é um livro escrito por Thomas Cathcart and Daniel Klein que explica, através de um diálogo repleto de humor, as reflexões filosóficas de vários pensadores ocidentais sobre a vida, a morte, e a vida depois da morte.
Este é um livro interessante para quem se questiona sobre os temas analisados ou para quem quer conhecer um pouco mais de filosofia. Esta disciplina é aqui tratada de um modo informal e acessível a qualquer leitor. É possível encontrar neste livro o registo de vários filósofos tais como Platão, Descartes, Espinosa, Heidegger, Nietzsche, Camus, Sartre e até mesmo B. Russel.
O capítulo que mais me interessou talvez tenha sido o que faz referência ao conceito de Céu, ou Paraíso. Os autores tentaram compreender a origem deste conceito, e de como evoluiu até às várias concepções que fazemos do mesmo. Por exemplo, analisando o Antigo Testamento constataram que os Hebreus não tinham qualquer noção do que hoje chamamos “Céu” nem da vida depois da morte. Segundo aos autores, quando o profeta Daniel fala de “vida eterna”, refere-se-lhe em termos de ressurreição (1).
Já no Novo Testamento, quando Jesus se refere ao “Reino dos Céus”, ele quer dizer Reino de Deus. Mas como os primeiros cristãos tinham origem judaica, não usavam o nome de Deus por ser considerado demasiado sagrado (2). Assim, o Reino dos Céus, em vez de ser considerado um lugar, deve ser tido em conta como um tempo, um tempo futuro, em que a vontade de Deus se tornaria aceite por todas as pessoas. Como esclarecem os autores, aquando da oração “venha a nós o vosso reino”, entender-se-á venha a nós esse tempo de Deus connosco (3).
Toda esta análise continua até encontrarmos outra ideia que facilmente reconhecemos no nosso imaginário colectivo: S. Pedro com as chaves do Paraíso. Segundo os escritores deste livro, esta ideia surge da junção de duas passagens bíblicas: Jesus diz que dará a Pedro as “chaves do reino dos céus”(4), no Evangelho de S. Mateus; e, de acordo com as visões de João no Livro do Apocalipse, na Nova Jerusalém encontram-se doze portas, sendo cada uma delas paradisíaca – daqui chegamos à imagem de S. Pedro às portas do paraíso.
Também o conceito da estética do Céu varia. Há quem o imagine como um local suspenso nas nuvens, ou então como um magnífico prado relvado. Ambas as imagens chegam ao nosso imaginário colectivo através de representações artísticas da Idade Média e do Renascimento (5). Esta visualização depende ainda da seita ou religião seguida por determinada pessoa.
É claro que o livro aborda outras questões e as várias abordagens por parte dos filósofos ao longo do tempo. A título de exemplo, podemos encontrar as questões sobre o que é viver a vida, a problemática do absurdo da vida, o tema do suicídio, reflexão sobre as vantagens e desvantagens da imortalidade, a relação entre as novas tecnologias e as ciências da saúde, e outros temas.

Fonte:
Cathcart, T. & Klein, D., “Heidegger e um hipopótamo chegam às portas do paraíso”, Publicações D. Quixote, Alfragide, 2010 – tradução de Isabel Veríssimo

Para saber mais:

Notas:
(1) – Como explicado pelos autores, é um regresso à vida, e não a continuação da vida noutro lugar.
(2) – Lembrar de um dos mandamentos do Antigo Testamento, o de não invocar o nome de deus em vão.
(3) – O texto referente a esta discussão pode ser encontrado em: T. Cathcart & D. Klein (2010), pp. 132-143.
(4) – O que se deveria entender é que Pedro iria ter um papel importante no anúncio do novo tempo, ou nova era.
(5) T. Cathcart & D. Klein (2010), pp. 148-164.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

In Memoriam

É com pesar que recentemente vemos desaparecer algumas conhecidas figuras do nosso panorama cultural. O Armarium Libri recorda e homenageia aqui a memória da escritora Matilde Rosa Araújo (1921-2010), do escritor José Saramago (1922-2010), do escritor João Aguiar (1943-2010), do actor António Feio (1954-2010) e do biólogo e historiador da ciência Carlos Almaça (1934-2010). O falecimento de figuras desta qualidade causa sempre prejuízos irreparáveis, cujos efeitos só se podem medir a longo prazo. No entanto, outra geração cá fica para continuar e inovar.

O estranho caso do padre ateu

Muito brevemente, refiro a existência de um livro intitulado “Deus maldito” (1999), escrito pelo teólogo Hermínio Araújo. O próprio título é um irónico jogo de palavras, dirigido aos que fazem uma interpretação literal da bíblia (ou seja, uma interpretação incorrecta) (1), encontrando nela, assim, um deus maldito. Isto porque o deus do Antigo Testamento aparenta ser uma entidade vingativa, que castiga e que destrói (em oposição do deus do novo testamento) (2). Defende o teólogo que esta é uma descrição incorrecta do deus cristão, logo, deus torna-se mal dito (ou, como salienta, dito mal). Deste modo, o padre assume-se como ateu, mas ateu perante este deus “mal dito”. Informa o padre que o verdadeiro deus cristão é um deus de amor e de perdão, e é neste deus que ele crê.

Trata-se de um livro bastante curto e com informação sucinta. São sete os capítulos: 1 –Sou ateu; 2 – Deus inútil; 3 – Deus impotente; 4 – Deus imoral; 5 – Deus injusto; 6 – Deus ilógico; 7 – Amor maldito. Esta técnica, utilizada na apresentação dos capítulos, é a mesma usada em alguns sermões para que a audiência se questione e preste atenção ao modo como o orador explicará as suas afirmações (recordar sermões do padre António Vieira). Assim, o padre desmistifica (ou justifica) cada um dos títulos, ou as concepções erradas de deus.

O padre franciscano escreveu este livro com o intuito de apresentar “tópicos para uma reflexão teológica”(3).

Sobre o autor do livro:
“Frade e padre franciscano. Licenciado em teologia (Lisboa) e especializado em ética teológica (Roma). Reitor do Seminário das Missões Franciscanas. Assistente Nacional da Juventude Franciscana Portuguesa e Capelão da Clínica Psiquiátrica de S. José.” (4)

Fonte:
Araújo, H., “Deus maldito”, Editorial Franciscana, Lisboa, 1999

Notas:
(1) – A Bíblia é um conjunto de livros com uma escrita simbólica, não devendo ser interpretada literalmente. Na introdução da maioria das Bíblias (pelo menos nas católicas) vem a informação de que as mesmas não servem como livros de história nem de ciências, são livros de religião, logo, apenas de crenças. A sua interpretação literal (ou de qualquer livro sagrado) tende a levar ao fanatismo religioso.
(2) – O Antigo Testamento tem uma origem na cultura Semita, e é comum às três religiões ocidentais, a saber: judaísmo, cristianismo e islamismo. O Jesus histórico vem criar uma ruptura epistemológica com esta religião e apresentar uma nova doutrina e, por conseguinte, uma nova cultura, logo, também uma nova visão de deus – o deus cristão.
(3) – Hermínio Araújo (1999), p. 9
(4) – Idem, p. 5

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

O Fim da Pobreza

“O Fim da Pobreza” é um livro de divulgação da área das ciências económicas, da autoria do economista norte-americano Jeffrey Sachs. Segundo a tese do autor, é explicado que é possível acabar com a pobreza extrema no Mundo se todos os países se empenharem nessa missão, como acordado no Projecto do Milénio assinado pela comunidade internacional. O Projecto do Milénio foi criado em 2002 por Kofi Annan, então Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU). O objectivo desta iniciativa é planear e executar um plano global que permita que vários países atinjam as medidas estabelecidas pela ONU até 2015. São oito, essas medidas, a saber: 1) Erradicar a fome e a pobreza; 2) Conseguir educação fundamental para todos; 3) Promover igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres; 4) Reduzir a mortalidade infantil; 5) Melhorar a saúde maternal; 6) Combater a Sida, malária e outras doenças; 7) Garantir o desenvolvimento em equilíbrio com a natureza; 8) desenvolver uma parceria global para o desenvolvimento.
Mas o que saliento em termos de importância neste livro é a explicação clara dos assuntos abordados, assim como a desmistificação de alguns preconceitos sociais. A mais-valia deste livro é o facto de o autor, no seu currículo, ter muito trabalho de campo, em contacto com as pessoas e com as situações dos países que analisa, quer se trata da Bolívia ou da Polónia quando sofreram hiperinflação, quer se trate da pobreza na Ásia e na África.
Na versão portuguesa, este livro conta com os prefácios do músico Bono, e do padre Vítor Melícias.
Este livro, devido à sua importância (cultural, cívica e humanista), merecerá mais desenvolvimento neste blog, o que, por uma questão de espaço, não nos é permitido fazer agora neste texto.

Sobre o autor:
Jeffrey D. Sachs formou-se na Universidade de Harvard, onde leccionou durante 20 anos. Especialista na área da luta contra a fome, doença, pobreza e a dívida de países do Terceiro Mundo, tem escrito centenas de artigos sobre estas temáticas. É director do Instituto da Terra (Earth Institute), professor na Universidade de Colúmbia, conselheiro especial do anterior secretário-geral das Nações Unidas, Kofi Annan, e director do Projecto Milénio da ONU. O seu trabalho como conselheiro económico dos governos da América Latina, Europa do Leste, Ásia e África, trouxe-lhe reconhecimento internacional.

Fonte:
Sachs, Jeffrey; “O Fim da Pobreza – como consegui-lo na nossa geração”, Casa das Letras, Cruz Quebrada, 2006 – Tradução de Paulo Tiago Bento

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Menina na Praia, de Ofélia Marques

A pintura da imagem faz parte da obra de Ofélia Marques (1902-1952), esposa de Bernardo Marques (1899-1962), célebre artista moderno. Ofélia Marques começou por se licenciar em Filologia Românica, mas veio a tornar-se numa pintora talentosa, até premiada com o Prémio Souza Cardoso. As cores vivas da Menina na Praia, bem como as formas simples, contribuem para a candura da obra. Assim, o resultado pictórico relativamente elementar, sem definições excessivamente pormenorizadas, e o olhar enigmático da rapariga poderiam ser como que dois traços da memória da infância: a lembrança vaga dos acontecimentos e o encanto, por vezes ambíguo, que lhes são o ambiente.
Fonte: Manuel Alves de Correia, O Grande Livro dos Portugueses, Círculo de Leitores, 1990, p.338.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Le Petit Nicolas


Uma das coisas mais saudáveis da vida é poder relembrar os emocionantes, imprevisíveis e alegres dias de escola por que se passou. Fica desses tempos a recordação da simplicidade das coisas e de certa inocência no olhar para tudo. Quando se chega a adulto, mudam as circunstâncias. Como viver não é de graça, pelo menos nalguns aspectos, é necessário trabalhar, ser responsável pelo que se faz e, eventualmente, por uma família. Para que haja crianças com o seu pleno direito à infância, é preciso haver adultos que vão resolvendo os problemas complicados do quotidiano. Fica então todo o espaço para a espontaneidade desempoeirada dos petizes. Decerto se tem escrito muito sobre isto em literatura, mas continuamos a pensar que as aventuras do petit Nicolas são únicas e muito recomendáveis para todas as idades. Pela voz do próprio Nicolas, um menino que anda na primária, acompanhamos o seu dia-a-dia na escola, as suas brincadeiras, partidas, jogos de futebol e brigas com os amigos. Não faltam personagens-tipo, como o Alceste – guloso da turma –, Clotaire – o pior aluno –, Geoffroy – o rapaz cujos pais são ricos –, Eudes – o rapaz brigão –, ou Agnan – o melhor aluno, afectado e misantropo. Sobretudo, há uma grande ternura na narração e um convite ao optimismo juvenil, como seu natural apanágio. Por vezes, a simplicidade das crianças leva a que sejam mais sensatas que os próprios pais. É o que acontece no dia em que Nicolas recebe uma bicicleta nova. Quer o seu pai, quer o seu vizinho (que são rivais) começam a exibir as suas proezas, atraindo até os risos de mofa das pessoas, pois são dois adultos numa bicicleta de criança. A bicicleta acaba por se inutilizar e Clotaire, a quem já acontecera o mesmo, diz a Nicolas: “É sempre a mesma coisa com os pais: fazem disparates e se não estamos com atenção, estragam as bicicletas e aleijam-se.”[1] Estas histórias, da autoria de René Goscinny (1926-1977)[2], com ilustrações de Jean Jacques Sempé, estão traduzidas em Portugal, mas se o leitor souber francês aconselhamos vivamente a leitura do original, que nos parece superior.

Alguns títulos:


Portugal (Teorema):
As Aventuras do Menino Nicolau
As Férias do Menino Nicolau
As Brincadeiras do Menino Nicolau
O Menino Nicolau e os Amigos
O Balão do Menino Nicolau
O Regresso do Menino Nicolau
, 3 vol.

França:
Le Petit Nicolas
Les Récrés do Petit Nicolas
Les Vacances du Petit Nicolas
Le Petit Nicolas et les Copains
Le Petit Nicolas a des Ennuis
Les Bêtises du Petit Nicolas
Six Histoires Inédites du Petit Nicolas
Le Petit Nicolas et ses Voisins
Le Petit Nicolas Voyage
La Rentrée du Petit Nicolas
Les Surprises du Petit Nicolas
Le Petit Nicolas s’ Amuse

Notas:
[1] Sempé-Goscinny, Le Petit Nicolas, Éditions Dënoel, 1999, p.117.
[2] Também co-autor de Asterix e Lucky Luke.

A imagem vem do livro Le Petit Nicolas et les Copains, Éditions Dënoel, 1994 (capa).

domingo, 27 de junho de 2010

O Mundo de Sofia


Sobre o Livro:
Conta a estória de uma jovem rapariga, Sofia, que começa por receber pelo correio cartas com perguntas estranhas, como “Quem és tu?” e “De onde vem o Mundo?”. Seguem-se mais cartas com mais interrogações, mas também com explicações. Vem a descobrir, mais tarde, que quem tem andado a remeter-lhe a correspondência é um professor de filosofia, Alberto Knox, com o intuito de dar-lhe a conhecer não só a disciplina, mas levando Sofia numa interessante, e igualmente fascinante, viagem pelo pensamento filosófico ao longo dos séculos, desde a época dos filósofos pré-socráticos e da Antiguidade, passando pela Idade Média, Renascimento, Iluminismo, até ao presente. O enredo adensa-se quando Sofia recebe postais de um major, de nome Albert Knag, funcionário da ONU em missão no Líbano, mas esses postais são destinados a Hilde, filha do militar. Para além da reflexão dedicada às lições que tem recebido do filósofo, Sofia debruça-se ainda a tentar descobrir quem é Hilde, e por que razão o major envia postais para a sua residência. Este é um romance repleto de reviravoltas, em que nem tudo o que parece é.

O autor aborda uma variedade de acontecimentos e de personagens históricas, mas, mais relevante ainda, faz a contextualização no período em análise, algo muito importante em história. Esta contextualização histórica da sociedade ocidental é extremamente importante para a nossa formação individual e enquanto cidadãos, para melhor compreensão da sociedade que nos rodeia. O autor salienta esta importância logo na abertura do livro, com uma citação do pensador e escritor alemão Johann Wolfgang Goethe: “Quem não sabe prestar contas de três milénios permanece nas trevas ignorante, e vive o dia que passa.”

Se bem que este é um romance inicialmente dedicado a jovens, na minha opinião pode e deve ser lido por pessoas de todas as idades, e por todo o público. Se o leitor gosta de temas como filosofia, história, ciência, religião, política, aventura, mistério, suspense, ou simplesmente de boa literatura, então este é um excelente livro para si. Não se trata apenas de uma leitura de lazer, mas de uma aprendizagem informal.

Sobre o autor:
Jostein Gaarder nasceu em 1952, estudou Línguas Escandinavas e Teologia na Universidade, foi professor de Filosofia, e é autor de diversos contos e romances para crianças jovens. Ganhou vários prémios literários, mas foi com “O Mundo de Sofia” (1991), a sua obra mais conhecida, que ganhou uma maior projecção internacional. Desde 1993 dedica-se exclusivamente à carreira literária.

Fonte:
Jostein Gaarder, “O Mundo de Sofia”, 29ª edição, Editorial Presença, Barcarena, 2009 – tradução de Catarina Belo.

O regresso de Salgari


O escritor italiano Emilio Salgari (1862-1911) é uma das referências mais perenes da cultura popular europeia, senão mundial. E, no entanto, como o Charlot que no imaginário do público substituía o Chaplin seu criador, fica muitas vezes na sombra de heróis como o Sandokan. Os livros de Salgari eram um dos supremos prazeres da juventude portuguesa desde o início do século XX, mas o autor terá ficado um tanto esquecido durante os anos ’80 e ’90. Outros heróis mais espectaculares, mas menos humanos, tomaram o lugar das suas personagens: lembramos, ao acaso, o Sangoku, as criaturas bizarras do Pokemon, os X-Men e as Tartarugas Ninja. Porém, há um certo amadurecimento que se consegue com o passar dos anos e dos trabalhos e que devolve aos antigos fãs destes heróis irreais o gosto por uma boa aventura salgariana, em espaços verosímeis, com personagens coerentes e humanas, deixando no leitor uma impressão saborosamente realista da ficção. Falamos assim, pois Emilio Salgari está a regressar às livrarias portuguesas em edições modernas. Para quem não o conhece ainda, este autor nasceu em Verona (Itália) a 21 de Agosto de 1862 numa família burguesa, estudou no Instituto Técnico Naval de Veneza, tendo podido viajar e descobrir o seu talento literário, pois “alguns apontamentos sobre as suas impressões de viagem despertaram nele a vocação de escritor e, em 1883, iniciou-se no periódico milanês La Valigia, com um conto intitulado Os Selvagens da Papuásia.”[1] Fixado na sua terra natal, Salgari começou a publicar em folhetins o romance Tay-See, que em volume teve o título A Rosa do Dong-Giang. “Deu assim início à sua, ao mesmo tempo feliz e atormentada, carreira de escritor”[2]. Casado e com quatro filhos, Emilio Salgari passou a vida preocupado com dívidas e cheio de trabalho, a fazer lembrar o nosso Camilo Castelo Branco (1825-1890), cujo génio literário nem sempre é evidente no meio do afã para assegurar mais uma refeição na mesa familiar. Assim, “da pampa às Caraíbas, da Malásia ao Oeste americano, de África ao Oriente, Salgari povoou a Terra de heróis e heroínas atormentados e arrojados, de injustiças, vinganças e paixões; não importa que nunca tenha sulcado os mares, nem tenha cruzado as selvas (...); não importa que toda a documentação tenha sido obtida na biblioteca pública, nem que nunca tenha sido um herói de verdade. Salgari foi algo mais, foi e é o pai dos heróis, o que permite que todos os seus leitores sulquem os mares, ele que nunca navegou [sic], e combatam a injustiça com a mesma valentia dos heróis com quem sonhou.”[3]
De Emilio Salgari estão disponíveis em Portugal:

Os Mistérios da Selva Negra, Temas e Debates, 2003
O Corsário Negro, Via Óptima, 2009 (ou Temas e Debates, 1997)
O Capitão Tormenta, Via Óptima, 2009
A Rainha das Caraíbas, Via Óptima, 2009
Viagem sobre o Atlântico em Balão, Sopa de Letras, 2010

Notas:
[1] Emilio Salgari, Os Mistérios da Selva Negra, Lisboa, Temas e Debates, 2003, p.5 (nota introdutória sobre a vida de Salgari, que aqui seguimos).
[2] Ibidem.
[3] Ibidem, p.6.
A imagem exposta acima vem da Nova Enciclopédia Larousse, dir. de Leonel de Oliveira, vol.20, Círculo de Leitores, 1999, p.6181.