segunda-feira, 9 de junho de 2008

Bocage e os novos temas poéticos

Liberdade, onde estás? Quem te demora?
Quem faz que o teu influxo em nós não caia?
Porque (triste de mim!), porque não raia
Já na esfera de Lísia a tua aurora?

Da santa redenção é vinda a hora
A esta parte do mundo, que desmaia.
Oh!, venha... Oh!, venha, e trémulo descaia
Despotismo feroz, que nos devora!

Eia! Acode ao mortal que, frio e mudo,
Oculta o pátrio amor, torce a vontade,
E em fingir, por temor, empenha estudo.

Movam nossos grilhões tua piedade;
Nosso númen tu és, e glória, e tudo,
Mãe do génio e prazer, ó Liberdade!


Manuel Maria Barbosa du Bocage (1765-1805), natural de Setúbal, era um poeta chamado "de transição" pelos académicos, pois evidencia cacterísticas neoclássicas, nomeadamente em referências mitológicas, e características românticas, principalmente nos temas. No tempo do Elmano Sadino em Portugal, circulavam entre os intelectuais as ideias novas do século - em especial inspiradas por escritores franceses. Porém, os livros dos filósofos que haviam escrito sobre liberdades individuais ou representatividade do povo junto do poder não circulavam livremente. A Revolução Francesa (1789), veiculando ideais baseados nas novas sugestões dos pensadores, acabou por derrubar o Antigo Regime em França, o que se fez sentir também em Portugal a partir de 1820. Começaram aqui as novas ordens jurídica e económica que mudaram profundamente as sociedades ocidentais - na prática com alguma lentidão, por causa das naturais resistências à mudança e da dificuldade e imperfeição das primeiras implementações. O modelo jurídico do Estado saído desses tempos é, com actualizações, aquele que ainda hoje adoptamos. Não é demais, portanto, relembrar os nossos antepassados porque, ainda que estejam ausentes há séculos, continuam a orientar as nossas ideias do que deve ser uma sociedade civilizada.

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